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Universidade Federal do Ceará
Museu de Arte da UFC – Mauc

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Exposição 1963.03 – Oito Artistas do MAUC – 20/06/1963

(Transcrito do Catálogo)

Antigamente, lá pelos idos de 1940, houve o Centro Cultural Cearense de Belas Artes, depois transformado em S. C. A. P. (Sociedade Cearense de Artes Plásticas), agrupando homens que se interessavam pelas artes plásticas em Fortaleza, profissionais e amadores, pintores do domingo e da semana, pintores de cavalete e de placas. Houve naquela época realmente um cheiro de tinta, uma vontade de tinta, uma ânsia de desenhar, de pintar, de aprender, de vasculhar a humanidade local — que é a humanidade universal. Homens se deslocavam no domingo (perdão, Senhor, era domingo o dia de trabalho para nós, pois a semana era de outras ocupações), e nos morros e subúrbios de Fortaleza uma caravana partia, a moda Van Gogh (não temos a pretensão dos mestres, mas jeito, gestos e instrumentos de trabalho eram os mesmos), e daquelas excursões nasciam figuras e passagens, às vezes simples naturezas mortas de peixes ou rutas.

Outras vezes, de noite, nos sótãos, se desenhava, uns posando para os outros, pintores representando Cristo ou Barrabás, prostitutas (não havia o chamado modelo) ensaiando Madalenas ou Madonas. Éramos jovens meio bíblicos e anedóticos, havia vontade e pureza no ambiente. Queríamos aprender e fazer, queríamos uma irmandade que só a arte nos dava. E havia também um pouco de sã boêmia, eram jovens os “pintores de Fortaleza”.

Depois o movimento cresceu, mais gente ia chegando: romancistas, poetas, músicos, jornalistas e “perus” (“peru” gente, muito “peru”). Nasceu e veio também o grupo “Clã”, a revista “Clã”, vieram livros publicados, exposições, artigos de jornais, ilustrações, tudo nascendo da prata da casa.

Apenas cito alguns nomes, pois tantos eram os aficcionados, diurnos e noctívagos, mas todos plenos de fé. Hoje a vida e a luta se encarregam de separá-los ou a morte, que também conta, e como conta! Mas havia os mestres: o Raimundo Cela, o Gerson Farias; havia o rapaz louro, talentoso e culto que veio do estrangeiro e que fazia mágicas ao nativo: Jean-Pierre Chabloz; o intelectual e irrequieto Mário Baratta (com dois TT como ele fazia questão de frisar); havia fotógrafos do sul que faziam ampliações coloridas; enfim, havia um movimento de Arte e o grupo sempre se renovava.

Às vezes quente, outras vezes um pouco frio, mesmo assim os “pintores de Fortaleza” nunca pararam. Espetados por cactos ou acariciados por lírios, cérebros e corações nunca estagnaram, indagando sempre o “por que” das coisas. Entre secas ou enchentes, com alegria ou sofrimento, o barco sempre navegou. Com o tempo uns abandonaram a terra definitiva ou provisoriamente (o cearense não emigra sempre?) para centros maiores, outros abdicaram do mundo, mas há os que fizeram “finca – pé” e ficaram por aqui mesmo. A eles a luta.

Fortaleza cresceu e uma mentalidade de povo e de público está se formando. Uma elite que era pequena já está se alargando em espírito. Existem Universidade e Clubes movimentando professores e jovens, tudo trazendo uma inquietação, um fervilhamento cultural. A Reitoria da Universidade do Ceará nos deu um museu — o M.A.U.C., que deve ser uma instituição viva e dinâmica, com bases eruditas e populares — e aí o “popular” também e erudito e autêntico, pois o Ceará é um dos maiores celeiros de arte popular, base essa que pode ser a pedra fundamental da nossa arte moderna. Picasso não inspirou-se na arte negra? Miró não foi buscar elementos básicos de sua pintura nas cavernas de Altamira? Figuras de Tanagra ou Figuras etruscas, tão louvadas hoje em dia, não eram no antigamente um labor cotidiano do povo? Logo, o Museu de Arte da Universidade do Ceará, tirando moldes em fonte de arte popular, esta certíssimo. Evidentemente tudo isso trará um conteúdo de arte sadia e autêntica.

Não posso deixar de louvar a iniciativa de nosso Reitor, o professor Antônio Martins Filho, que com determinada coragem e clarividência, tanto tem impulsionado o movimento de arte no Ceará. E tenho certeza, mesmo que venha depois outro Reitor — e quantos Reitores vierem — que a semente está já plantada e que a árvore crescerá.

Esta árvore agora mesmo nos dá oito artistas — pintores, desenhistas, gravadores — oito artistas (eu no meio) que irão correr mundo. Digo correr mundo porque mesmo que a gente mude só de rua, já está correndo mundo. Imaginem que esta será uma exposição intinerante em várias capitais do Brasil.

Lívio Xavier Júnior, nosso diretor (outro que acredita que o erudito pode vir do popular sem que isso vire folclore) me pediu para fazer essa apresentação, e eu tento fazer um pouco de estória do grupo, uma estória rápida que acredito em plena frutificação.

O artista é apenas um instrumento que deve captar beleza e poesia a fim de transmiti-las ao mundo, sendo ele seu próprio crítico, ele que sabe e que determina. Mesmo quando o artista erra — errando com consciência e dignidade, esse erro só pode se transformar num fator positivo da criação.

Bandeira, Nearco, Heloisa, Floriano, Aldemir, Sérvulo, Zenon, Estrigas são frutos da árvore que está crescendo, estão enraizadas no Ceará, e vão correr mundo. Nearco veio do Amazonas, aqui aportou e aqui está pintando; Heloísa, moça daqui mesmo, fiel à terra, pinta com filhos no colo e marido médico operando; Floriano veio do barroco e dos azulejos do Maranhão; Aldemir corre mundo também; Sérvulo veio do Crato, inspirado em gravuras populares, tornou-se ele próprio gravador de vanguarda e hoje forma na Escola de Paris; Zenon se angustia entre a pintura, o desenho e a escultura, e não sai da terra; Estrigas pinta entregue à bucólica de um sítio em Mondubim; eu, ando correndo faz tempo e contente com isso. Mas todos vivem ou viveram pensando na luz de Fortaleza, em atitudes passadas, presentes ou futuras — oito artistas pertencentes ao acervo do M.A.U.C.. Somos oito artistas de Fortaleza que queremos correr mundo. É com prazer que escrevo esta introdução — não digo apresentação — porque as artes destes moços se apresentarão por si mesmas, viverão e transmitirão suas mensagens próprias. O importante é que continuamos a trabalhar e fazer — precisamos fazer para provarmos que estamos vivos. O importante e que o M.A.U.C. comece seu primeiro passeio pelo mundo, unindo arte popular a arte moderna ou erudita. O importante é que estes artistas sejam vistos, compreendidos e respeitados na sua dignidade de luta, consciência e trabalho.

Antônio Bandeira
Fortaleza, junho de 1963.


Obras Expostas

Antônio Bandeira

1- Tríptico – óleo s/ tela (1961) 5,310 x 2,000

Nearco Araújo

1- Vitral – óleo s/ tela (1963) 0,500 x 0,650
2- Estrutura – óleo s/ tela (1963) 0,500 x 0,650
3- Composição em Vermelho – óleo s/ tela (1963) 0,500 x 0,650
4- Cidade Submersa – óleo s/ tela (1963) 0,500 x 0,650
5- Floresta Negra – óleo s/ tela (1963) 0,550 x 0,800
6- Dissolução do Azul – guache (1963) 0,310 x 0,435
7- Matinal Azul – guache (1962) 0,310 x 0,435
8- A Grande Medusa – guache (1963) 0,310 x 0,435
9- Turbilhão – guache (1963) 0,260 x 0,340

Heloísa Ferreira Juaçaba

1- Pintura I – óleo s/ tela (1962) 0,406 x 0,505
2- Pintura II – óleo s/ cartão (1962) 0,460 x 0,334
3- Pintura III – óleo s/ fibra (1962) 0,250 x 0,420
4- Pintura IV – óleo s/ fibra (1962) 0,397 x 0,250
5- Pintura V – óleo s/ fibra (1962) 0,390 x 0,250

Aldemir Martins

1- Figura Humana – Nanquim (1961) 0,675 x 1,020
2- Figura Humana – Nanquim (1961) 0,675 x 1,020
3- Cangaceiro – Nanquim (1961) 0,675 x 1,020

Floriano Teixeira

1- São Jorge e o Dragão I – Nanquim (1963) 0,705 x 0,500
2- São Jorge e o Dragão II – Nanquim (1963) 0,705 x 0,500
3- O Adamastor – Nanquim (1963) 0,500 x 0,625
4- Tempestade – Nanquim (1963) 0,625 x 0,500
5- Silvana entre a Flor e o Peixe – Nanquim (1963) 0,625 x 0,500
6- Silvana e a Vitória de Samotrácia – Nanquim (1963) 0,625 x 0,500

Sérvulo Esmeraldo

1- Gravura I (1960) 0,237 x 0,402
2- Gravura II (1958) 0,290 x 0,338
3- Gravura III (1958) 0,194 x 0,339

Zenon Barreto

1- Óleo I – óleo s/ tela (1963) 1,000 x 0,810
2- Óleo II (1963) 0,350 x 0,480
3- Guache I (1963) 0,350 x 0,480
4- Guache II (1963) 0,330 x 0,430
5- Guache III (1963) 0,380 x 0,480
6- Guache IV (1963) 0,300 x 0,440
7- Guache V (1963) 0,350 x 0,480
8- Guache VI (1963) 0,350 x 0,380
9- Desenho I (1963)
10- Desenho II (1963) 0,360 x 0,460

Estrigas (Nilo Firmeza)

1- Pintura I – óleo s/ tela (1961) 0,900 x 0,215
2- Pintura II – óleo s/ tela (1961) 1,245 x 0,170
3- Pintura III – óleo s/ tela (1961) 0,920 x 0,155
4- Pintura IV – óleo s/ tela (1961) 0,950 x 0,230
5- Pintura V – óleo s/ tela (1961) 0,875 x 0,220
6- Pintura VI – óleo s/ tela (1961) 0,900 x 0,170


Catálogo da Exposição Oito Gravadores 1963

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