Exposição 1974.04 – Rendas de Bilro e Peças da Coleção Arthur e Luiza Ramos – 24/10/1974
Fruto de um paciente e minucioso trabalho de pesquisa, desenvolvido ao longo de vários anos por Luíza e Arthur Ramos, as peças reunidas nesta mostra constituem uma seleção das mais representativas das coleções que integram o acervo do Departamento de Sociologia da Universidade Federal do Ceará.
Além de um rico mostruário de rendas de bilro de procedência de várias regiões brasileiras e de alguns países europeus, integram esta exposição valiosas esculturas africanas, elementos decorativos de uso pessoal e instrumentos (bilros) utilizados na elaboração artesanal das rendas, em várias partes do mundo. Apresentando esta mostra, o Museu de Arte e o Departamento de Sociologia incorporam-se à programação relativa ás festividades do 20º aniversário de criação de Universidade Federal do Ceará e prestam uma homenagem ao grande antropólogo Arthur ramos, cujo 25º aniversário da sua morte transcorre neste mês de outubro.
Seu Papel na Antropologia Brasileira
(Arthur e Luiza Ramos)
Arthur Ramos
1903 -1949
Nascido no começo deste século, e tendo sua formação universitária orientada para as ciências médicas, Arthur Ramos logo revelou sua tendência para assuntos ligados ao comportamento humano, quando orientou sua atividade profissional e acadêmica dos primeiros anos que se seguiram à graduação aos estudantes de psicologia e psicanálise. Até os trinta anos de idade, esteve basicamente preocupado e ocupado em temas psicológicos.
Ocorria, entretanto, que, com sua atitude de verdadeiro acadêmico, o jovem porém já famoso médico psicanalista, que contava em seu currículo com várias publicações sobre psicologia da infância (principalmente ligada a problemas da educação), de desvios comportamentais, de categorias minoritárias(principalmente negros), e de delinqüentes sociais, passou a se interessar mais e mais por assuntos de natureza sócio-cultural. Provavelmente influenciado pelos seus estudos da obra de grandes psicanalistas como Freud,Adler, Jung e pelos trabalhos de Nina Rodrigues e outros proto-antropólogos brasileiros, Arthur Ramos começa, em 1934, a escrever sobre temas eminentemente sócio- culturais: O Negro Brasileiro(1934), Folclore Negro do Brasil (1935), Introdução à Psicologia Social(1936), As culturas negras no novo mundo(1937), ao mesmo tempo que assumia cargos sempre mais próximos da área acadêmica em que mais se destacaria: a Antropologia.
Já em 1939 assume na recém-fundada Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil a cadeira de Etnologia e Antropologia, marcando definitivamente sua preferência pela cidade do homem. Pporém, foi na década de 40 que Arthur ramos firmou-se como antropólogo e tornou-se conhecido no mundo inteiro como autoridade internacional em assuntos de culturas negras, passando a manterintensa correspondência com antropólogos famosos dos principais centros universitários de vários países. Nessa década, o professor brasileiro, além de colaborar em cursos, simpósios e pesquisas com Departamento e professores particulares de Universidades onde a Antropologia já se encontrava mais desenvolvida, fundou no Brasil a Sociedade de antropologia(1941) e publicou sua grande síntese que é a Introdução á Antropologia Brasileira, além de ter recebido o título de Doutor em Ciências Sociais e o convite para dirigir o departamento de Ciências Sociais da Unesco.
Pode-se ter uma idéia do prestígio internacional e da 3estatura acadêmica de A. ramos quando se sabe do seu íntimo relacionamento com figuras do porte de T. Lyn-Smith, A. L. Kroeber, R. E. Lowie, M. J. Herskovits, R. Linton, C. Wagley, A. Metraux, G. P. Murdock, J. Doollard, com quem participou de seminários e mesas redondas sobre assuntos antropológicos; quando se tem registro dos convites recebidos de Universidades como: Louisiana State University, Stanford University, University of Califórnia (Berkley), Northwestern Universith, University of Minnesota, Columbia University, ou quando se sabe de sua aceitação como membro de associações do prestígio da The National Geographical Society ou da American Anthropological Association.
Autodidata nas Ciências Sociais, pautou suas atividades científicas sempre no sentido da auto-superação e da autocrítica a par de um sentido profundamente humanístico e humanitário. Arthur Ramos polarizou seu interesse sobre aspectos críticos do comportamento humano; por isso estudou preferentemente categorias como o neurótico, o marginal, as minorias étnicas, o primitivo e a criança, temas ainda hoje de profundo interesse para grande número de cientistas sociais. Foi um homem sempre preocupado em entender o modo pelo qual as características da estrutura e da organização social limitavam ou deformavam a plena participação de alguns grupos ou categorias sociais nos benefícios proporcionados pela sociedade.
Por tudo isso, pode-se depreender facilmente o papel de alta significação que teve Arthur Ramos na sistematização e desenvolvimento das Ciências Sociais em geral e da Antropologia, especialmente, como disciplina útil e fecunda nas Universidaes brasileiras. Mesmo não tendo fundado escola ou deixando um grande número de discípulos seguidores, Ramos pode ser considerado na tradição antropológica brasileira como Trylor ou Frazer o foram para a antropologia britânica: Morgan e Boas ppara a americana; Durkheim e Mauss (apesar de rotulados soció-logos) para a francesa. Sua atuação, como cientísta social, serviu tanto como estímulo e orientação de outros estudiosos mais jovens, quanto como motivo de orgulho para os antropólogos brasileiros que, mui justamente, poderiam elegê-lo para patrono.
João Pompeu de Sousa Brasil
Professor-Assistente do Departamento de Sociologia
LUIZA DE ARAÚJO (LUIZA RAMOS) – Professora do Instituto Nacional de Música, viúva do professor Luciano Gallet, casa-se, em 12 de fevereiro de 1935, pela segunda vez, com o emitente antropólogo brasileiro Arthur Ramos, e quem se tornaria companheira e colaboradora, responsável em grande parte pela divulgação de sua obra científica.
A coleção de renda de bilros do Museu Arthur Ramos, pertence ao Departamento de Sociologia do Centro de Humanidades da U.F.C., pode ser classificada como uma das maiores e mais importantes no gênero. Foi reunida ao longo de vários anos, graças a um cuidadoso trabalho de pesquisa, desenvolvido por Luiza Ramos, que se estendeu a diversas regiões do Brasil e a alguns países estrangeiros.
Em sua monografia A Renda de Bilros e sua Culturação no Brasil,publicada em colaboração com o profº Arthur Ramos, Luiza Ramos procura estudar as origens do artesanato feminino, como o bordado e a renda, detendo-se no exame da difusão da renda-de-bilro em algumas regiões da Europa, sobretudo na Península ibérica e, em seguida, no Brasil.
A “Coleção Luiza Ramos” tem despertado, como é natural, grande interesse entre os estudiosos da etnografia.
Valdelice Carneiro Girão
Conservadora do Museu Arthur Ramos