EU NÃO TENHO MEDO | Nova exposição entra em cartaz dia 3 de junho no Mauc propondo outros olhares sobre as identidades da população negra e periférica do Ceará
Data da publicação: 30 de maio de 2025 Categoria: Abertura de Exposição, Exposição, Notíciascom colaboração de Luizete Vicente, do Sobrado Dr. José Lourenço
Acontece nesta terça-feira, 3 de junho, às 10h, no Museu de Arte da UFC, a abertura da exposição EU NÃO TENHO MEDO, primeira individual do artista Blecaute, promovida pelo Sobrado Dr. José Lourenço em parceria com o Mauc. Com curadoria de Lucas Dilacerda, a mostra fica em cartaz até 4 de julho, apresentando um recorte de pinturas que discutem os temas da negritude, ancestralidade, periferia e religiosidade popular.
Ao contrário das imagens de sofrimento e violência que historicamente foram atribuídas ao povo negro, Blecaute mostra outras narrativas a partir de cenas de alegria, coletividade, espiritualidade e força. Seu gesto é político: é possível falar da dor sem reproduzi-la; é possível lembrar das lutas sem precisar revivê-las em sua forma mais cruel. “Meu trabalho, ao propor novos imaginários para pessoas negras e faveladas, narra histórias de força, ancestralidade, celebração e espiritualidade. O objetivo é não nos limitar a uma experiência de contemplação estética, mas retomar um espaço para afetos, memórias e construção”, explica Blecaute.

Anastácia LIVRE PRA CARALHO, 2023, Acrílica, bijuteria e papel alumínio sobre tela, 120 x 80 cm. Foto de Alexia Ferreira
Os retratos em EU NÃO TENHO MEDO subvertem a tradição da história da arte ocidental. Gênero historicamente reservado às elites — reis, nobres, clérigos, senhores de escravos —, o retrato é uma ferramenta de manutenção do poder: ser retratado era ser eternizado, ser reconhecido, ser lembrado. Mas o que acontece quando esse poder muda de mãos? Quando quem pinta é um jovem negro periférico e quem é retratado são pessoas comuns da sua comunidade ou figuras negras históricas apagadas dos livros e das telas, o que acontece é revolução. Blecaute subverte o gênero apresentando o retrato como arquivo visual de um povo que insiste em existir mesmo depois de séculos de apagamento.
Na exposição, não vemos apenas imagens — vemos presenças. Presenças que o tempo tentou apagar, mas que a arte insiste em fazer lembrar. E aqui entra o símbolo da sankofa, frequentemente presente nas pinturas do artista: um pássaro africano que olha para trás, ensinando que é preciso retornar ao passado para resgatar o que é essencial à caminhada. A exposição, nesse sentido, é também um dispositivo de memória e luta. É um convite a olhar para trás não com nostalgia, mas com sabedoria. Os que vieram antes de nós sonharam a liberdade. Muitos morreram por ela. E, ao lembrar dessas histórias, aprendemos como seguir lutando — em comunidade, em espiritualidade, em festa e em alegria.

Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens PRETOS, 2025, Óleo e tecido sobre tela, 120 x 60 cm. Foto de Alexia Ferreira
As pinturas de Blecaute são arquivos vivos. Cada rosto é um documento; cada cena, uma página reescrita da nossa história. E se não temos registros oficiais, temos agora retratos que atravessam o tempo e nos dizem “Eu não tenho medo”. A frase, que dá título à exposição e nomeia uma das obras, ecoa como manifesto. Porque lembrar é também lutar.
Mais do artista
Blecaute, 24, é nascido e criado no Conjunto Riacho Doce, no bairro Passaré (Fortaleza-CE). Artista visual e estudante de Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), concretiza estudos e sua visão de mundo enquanto negro e periférico através das artes plásticas.
Como autodidata, começou sua trajetória na pintura digital no final de 2019 e, atualmente, trabalha com diversos materiais e linguagens: “Minhas influências são múltiplas e não se resumem à arte visual e à pintura. Acredito que arte, de modo geral, é uma linguagem, e cada artista narra sua perspectiva a partir do meio e material que se é possível no momento.”
O artista tem passagem por exposições como a Funk: um grito de ousadia e liberdade, do Museu de Arte do Rio e que está, em caráter itinerante, na Instituição Maison Folie Wazemmes em Lille, França. No ano de 2025, fez parte da exposição Abre Alas 20, n’A Gentil Carioca, uma das principais e mais tradicionais galerias do Brasil.
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SERVIÇO
Abertura da exposição EU NÃO TENHO MEDO, de Blecaute
3 de junho de 2025, 10h
Museu de Arte da UFC
Av. da Universidade, 2854
Benfica, Fortaleza – CE
Tel: 85 3366 7481
Visitação gratuita de segunda a sexta, das 8h às 12h e das 13h às 17h
Classificação indicativa: livre