Exposição 1967.01 – Gravuras de Sérvulo Esmeraldo – 24/08/1967
(Transcrito do Folder)
Um Artista Realizado
A gravura, como manifestação estética, é uma das mais antigas modalidades de expressão e pode figurar, sem nenhum desdoiro, ao lado das arte irmãs – o desenho e a pintura.
De realização mais difícil e mais laboriosa do que as outras que lhe são correlatas, é justamente em razão disto que, quando um talento consegue através dela realizar-se, o faz de modo a tornar-se imperecível, como se os materiais inerentes à sua efetivação concorressem para garantir-lhe a perenidade.
Albrecht Dürer (1471-1528), ainda em nossos dias, é presença na História das Artes, graças às obras-primas que deixou, perenizadas em gravura. Assim ocorreu com o holandês Van Leyden (1494-1533), com o Floretino Antônio Pollaiuolo (1429-1498), mestres que asseguram as excelências da nobre arte, através do tempo até os nossos dias.
E é de ressaltar como a gravura tem acompanhado com donaire o evoluir das artes plásticas, fazendo avultarem, pelos novos moldes expressionais, nomes como o de Stanley Hayter, nos Estados Unidos, e Jean Emile Laboureur, na França, ambos dando à sua arte, que é nossa contemporânea, as dimensões exigidas pelo evolver da capacidade de concepção, sem esquecermos eu, no Brasil, talentos houve e os há, extraordinários, nêste campo da expressão plástica, bastando citar, como paradigma, a figura de Oswaldo Goeldi.
No Ceará, a arte da gravura, nos dias correntes, conta com algumas revelações. E se estas não logram realização plena isto se deve menos à ausência de talentos e mais à quase inexistência de ambiente e meios para a efetivação da quase mensagem.
Sérvulo Esmeraldo nasceu no Ceará e aqui começou a revelar seus pendores. Por algum tempo, integrou o grupo de artistas jovens responsáveis pela criação de novos horizontes artísticos em nossa terra.
Reconhecidos que foram os seus méritos excepcionais, o jovem pintor e gravador viu-se premiado com uma bôlsa de estudos em Paris, dada pelo govêrno francês.
Agora, é na Universidade que sempre lhe proporcionou estímulo, que Sérvulo Esmeraldo realiza uma exposição, depois de largo tempo de ausência. E o faz apresentando para mais de cinqüenta trabalhos em gravura, justamente representativos de vários anos de buscas, durante os quais – bem demonstra – vem apurando cada vez mais uma técnica que já se nos revela plena e ungida de forte cunho pessoal.
É mesmo curioso observar, no caso de Sérvulo Esmeraldo, a existência já de uma certa constante estrutural que predomina em obras de épocas diversas, evidenciando-se as modificações (para melhor) mais na parte artesanal, pois as fórmulas “mágicas” de concepção já se nos apresentam firmadas, constituindo um estilo próprio, em que a discreção se evidencia, através de um clima de impressiva poesia, nem sempre fácil de encontrar no abstracionismo, cujo campo de cogitações se vem entregando o artista, ao nosso ver, com proveito e segurança.
Constitui para nós a honra e prazer apresentar, nesta oportunidade, ao público cearense a monta de trabalhos em gravura de Sérvulo Esmeraldo, chamando especial atenção para leveza da fatura da maioria dêles e destacando também o extraordinário domínio que o autor nos patenteia, na justeza do traço e na consciência de emprêgo das côres, redundando em equilíbrio nem sempre encontradiço, mesmo na obra de artistas bafejados pela fama. Equilíbrio sem o qual a arte da gravura não pode ser interpretada e julgada como expressão de verdade absoluta.
Diante das obras ora em exposição, vem-nos o desejo de repetir Taine, quando diz, tratando da natureza e expressão da obra de arte: “…as várias obras de um artista são parentes umas das outras, como filhas de um mesmo pai, ou seja, têm entre si notáveis semelhanças.”
Quando assim disse, o mestre incomparável quis dar a idéia mais ou menos objetiva de como um conjunto de obra deve tender sempre para a unidade, quer quanto ao clima de concepção, quer quanto às fórmulas para a realização. Isto, ao nosso ver, já conseguiu Sérvulo Esmeraldo, que merece os parabéns e a palavra de agradecimento do Ceará artístico, pela maneira excepcionalmente digna como está representando, no estrangeiro, a cultura de sua terra de bêrço.
Otacílio Colares
Fort.18-88.67