Exposições 2023.8 – Internacional Print – 15/04/2023
O mundo é gráfico
Se apropriando de um espaço preparado nas cores branca e amarela, de formato geométrico irregular e localizado no Mauc (Museu de Arte da Universidade Federal do Ceará) está o que há de mais atual da Gravura de alguns países, do Brasil, e em especial do estado do Ceará. Destacando que, este último, encontra-se passando por um momento especial das Artes Visuais, através de um olhar especial e poético para as Gravuras. Dessa forma, convidamos você a fazer um passeio panorâmico pela Arte Visual da Gravura, uma linguagem artística bastante difundida no Brasil e no mundo, e que encontrou no Ceará um de seus centros de influência e de excelência.
Para a exposição a qual apresentamos, ponderamos, portanto, a excelente iniciativa do artista gravador Roberto José do Nascimento (Beto Nascimento), pernambucano radicado no Recife, um difusor, entusiasta e permanente guardião, que após a comunhão entre gravadores de diferentes partes do mundo, permitiu sonharmos com mais uma coletiva das artes gráficas, dessa feita, em nossa cidade de Fortaleza. Se juntaram a ele os artistas visuais e gravadores, Gerson Ipirajá (In-Gráfica), Zakira Nobre (Studio4) e o artista visual Francisco Ivo, em uma curadoria compartilhada.
As Gravuras são produzidas por meio de “impressões” em papel de diversas diagramaturas e realizadas a partir de uma matriz visando a multiplicação da imagem, fruto da criação do artista. As matrizes são produzidas em suportes rígidos ou flexíveis, tais como: pedra calcária, madeira, metal e placas de borrachas (litografia, xilogravura, gravura em metal, linoliogravura e serigrafia), trabalhadas com coifas ou outros, onde o processo de marcação no suporte utilizado pode ser alcançado por meio de incisões, riscos, gravações e até mesmo banhos de ácido, variando conforme o suporte e a técnica. A partir de então, a tinta gráfica é aplicada com rolo entre sulcos e fendas do desenho, o qual criará, utilizando-se de prensas, o efeito de positivo na reprodução da imagem. Para exemplificar: o processo se dá de maneira similar a um “carimbo”.
A definição de gravura original foi convencionada no III Congresso Internacional de Artistas de Viena, em 1960. Uma gravura original não tem sentido de cópia ou de reprodução. É um múltiplo, em que cada peça é um original. Para ser considerada original, cada gravura deve ter a assinatura do artista e a indicação do número da série e da edição total (por exemplo, 1/100). A assinatura do artista tem valor de endosso da qualidade da impressão.
Dessa forma, o apelo estético realizado somente a partir da impressão do preto no branco ou buscando possibilidades cênicas com efeitos de luz e sombra, se utilizando das formas e cores sutis e complexas na produção de mensagens artísticas e sociais, são inesgotáveis. Contudo, essas são definições simples demais para uma Arte Visual que tem muitos detalhes. Aliás, aqui vai um spoiler: você vai se surpreender após revelarmos que vários pintores famosos também foram gravadores. Por exemplo, podemos citar Pablo Ruiz Picasso, Katsushika Hokusai no melhor estilo Ukiyo-e japonês e ainda, Rembrandt van Rijn.
O surgimento da Gravura no Brasil remonta aos idos do período colonial, trazida da Europa, que desde o século XV estava em pleno renascimento das Artes Visuais, para ser empregada em diversos usos, desde estamparias em tecidos até a impressão de rótulos para aguardente. Porém, no caso do Nordeste, é a partir da segunda metade do século XIX que há uma primeira popularização da Gravura, através dos jornais da época, como em “O Mossoroense” – o jornal mais antigo do interior nordestino.
A Literatura de Cordel tem peso na rápida popularização da Gravura por aqui e contou com a xilogravura produzida por artesões para a ilustração de suas capas. A partir da segunda metade do século XX, dá-se a transição dos artesões das Gravuras para artistas das Gravuras, e isso ocorreu por meio de um processo de construção e transcendência do ato de gravar, como obra de arte em si, e teve em Inocêncio da Costa Nick ou simplesmente Mestre Noza (1897 – 1983), um artesão e posteriormente um artista visual que, por sua longevidade e por sua ampla produção, vivenciou essa mudança de experiências como nenhum outro.
Como gravuristas do Brasil destacam-se os artistas Carlos Oswald na criação da oficina de gravura do Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro. Temos ainda, Oswaldo Goeldi um nome essencial quando o assunto é Gravura, sendo o caráter expressionista da obra de Goeldi influenciador de toda uma geração de gravadores, como destaque dessa fase encontra-se Lívio Abramo. Assim como ocorre com diversas linguagens, os artistas passaram a experimentar composições geométricas e abstratas na gravura, de forma que Fayga Ostrower, polonesa naturalizada brasileira, é um bom exemplo deste percurso, assim como a artista Maria Bonomi que transitou entre o figurativo e o abstrato através de esquemas geométricos precisos e estruturados com um rico uso de cores, como podemos ver os mares e velas da Bahia no trabalho primoroso de Calazans Neto. Das feiras nordestinas citamos os três mestres J. Borges, J. Miguel e Amaro Francisco. No Ceará os destaques são muitos e não param de se renovar, mas citaremos: Raimundo Cela (professor de Gravura da Escola Nacional de Belas Artes – ENBA), Aldemir Martins, Sebastião de Paula, Sérvulo Esmeraldo que levou Mestre Noza para Paris, Francisco d’Almeida, Eduardo Eloy e Francisco Bandeira.
No momento atual, a Gravura no Ceará atravessa muita efervescência, pulsa no cotidiano dos acontecimentos das Artes Visuais com muita força, ocasionada pela reimplementação do Programa de Gravura na Escola de Artes e Ofícios – SECULTCE a partir de 2017, com a incrementação de um ateliê que proporciona a prática em todas as mídias gráficas, somada a ações como a do ateliê Mestre Noza – Universidade Federal do Ceará – UFC que atende a comunidade universitária, assim como, o curso de Artes Visuais do Instituto Federal – IFCE, têm nos legado bons artistas no Cenário da Gravura cearense. Tudo isso, são respostas colhidas pelo pensamento Coletivo que norteiam a prática e o pensar a Gravura, na qual a prensa funciona como se fosse uma fogueira, que reúne sonhos em seu entorno, e o ateliê é o espaço de compartilhamento por excelência.
E é com esse espírito do compartilhar que o Coletivo In-Grafika, aliado a outros parceiros, traz ao público de nosso estado a “Internacional Print Ceará – O mundo é gráfico”, mostrando um pequeno recorte dos caminhos que a Gravura percorre em 23 países, através das produções de seus artistas gravadores, que nos dão as boas-vindas para que possamos percorrer as veredas surpreendentes e desconhecidas que essa exposição proporcionará.